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Bará

Nos cultos de nação africana o Bará é tido como o mensageiro divino, guardião das casas, cidades e dos templos, é o senhor de todos os caminhos e recebe suas oferendas nas encruzilhadas. Em alguns terreiros ele tem o status de orixá, principalmente nos terreiros de batuque no Rio Grande do Sul, mas em outros locais ele é cultuado como exu, por isso não vou nomeá-lo como oríxá nem como exu, vou chamá-lo apenas de Bará, que foi como ele se apresentou para mim. Aliás sua função principal que é abrir os caminhos é muito parecida com a do Exu Tranca Rua e nós encontramos Bará vinculado justamente a um trabalho de abertura de caminhos.

Uma curiosidade interessante é que no Mercado Público de Porto Alegre há um assentamento dessa entidade, assentamento significa fixar a entidade em determinado local ou objeto através de magia, e inclusive o Bará do Mercado Público de Porto Alegre foi tombado como patrimônio histórico e cultural da cidade através de um projeto de lei. O assentamento é um mosaico circular de pedras e metal com sete chaves presas a correntes que partem do centro, como se fossem os raios de uma roda.

Não há um consenso sobre quem determinou ou fez esse assentamento no Mercado Público, mas as duas versões mais difundidas são, a primeira, bem fantasiosa a meu ver seria a de que os próprios negros que construíram o mercado fizeram o assentamento porque esse orixá representa a fartura. O Mercado Público de Porto Alegre foi criado em 1869 e acho muito pouco provável que os negros escravizados iriam assentar um orixá para dar fartura aos brancos sendo que eles viviam na miséria. A segunda versão que acredito ser mais crível é que o assentamento foi a mando do Príncipe Custódio, Custódio Joaquim de Almeida (1832-1935), Príncipe de Ajudá, um dirigente tribal africano exilado no Brasil que viveu no Rio Grande do Sul e foi quem introduziu no estado o batuque, foi o pai dos pais-de-santo aqui no sul.

Mas como já expliquei em várias postagens, uma coisa é a teoria, a crença e a mitologia das religiões sobre suas entidades e outra coisa é a prática da religião propriamente dita e quem se manifesta como orixá, exu ou qualquer outra entidade sempre é um espírito mortal como nós e não alguma divindade. Esse espírito que se apresentava como Bará está aqui no Brasil há cerca de 100 anos, veio direto do astral da África para Porto Alegre trabalhar em terreiro, provavelmente até invocado pelo próprio Príncipe Custódio. O terreiro ao qual ele estava vinculado agora era o terceiro em que ele trabalhou aqui, os outros dois já não existem mais. Esse Bará não teve nenhuma encarnação aqui no Brasil, sua última vida foi na África e ele era um guerreiro numa tribo que ficava onde hoje é a Angola e morreu em batalha.

Encontramos o Bará porque fomos contratados para fazer uma limpeza numa empresa de prestação de serviços cuja proprietária já fez vários trabalhos em terreiro, inclusive para abrir os caminhos, com oferendas para o Bará. Geralmente nesses casos quando não é magia da concorrência para atrapalhar o negócio é a própria entidade que deveria abrir os caminhos da pessoa que os tranca para que ela volte a fazer trabalhos no terreiro. Nesse caso era uma mistura das duas coisas, tanto tinha uma magia de uma empresa concorrente quanto o Bará que foi a entidade demandada para abrir os caminhos da empresa permitiu que a empresa sofresse um revés para que a proprietária voltasse a fazer oferendas a ele. Nós desmanchamos a magia da concorrência e limpamos a empresa, nada de mais, mas o interessante foi a ligação kármica que descobrimos entre o Bará e a proprietária da empresa que ele deveria abrir os caminhos.

O Bará inclusive estava indignado com a dona da empresa por não ter o procurado novamente. Conversei bastante com a entidade, sobre o trabalho dele nos terreiros, e ele me disse que a mulher poderia ir em qualquer terreiro que ele é quem iria pegar a oferenda, pois ela lhe devia, disse que ela havia ganhado muito dinheiro com ele, e então perguntei a ele em que circunstâncias ele conheceu a mulher, pois ele não foi escravo aqui no Brasil e sua última encarnação foi na África. Essa mulher era inglesa em uma vida passada e foi para África traficar escravos, ela mesma liderava um grupo que caçava os negros e o Bará era o chefe de uma tribo que se viu na iminência de ser toda escravizada e para salvar sua tribo ele fez um acordo com a mulher inglesa, ele iria ajudá-la a caçar e capturar negros de outras tribos contanto que ela deixasse a tribo dele em paz.

E assim foi, pelo menos até ele morrer caçando negros para a mulher inglesa. Essa foi a última vida do Bará, ele morreu e ficou no astral da África até ser chamado para cá para trabalhar em um terreiro de batuque. Nós resgatamos cerca de 3.800 espíritos de negros escravizados que foram traficados pela mulher inglesa naquela vida passada. Quanto ao Bará, como ele estava na empresa devido a um trabalho que a própria proprietária fez, nós o deixamos lá e claro, informamos a proprietária que a entidade estava insatisfeita com ela.

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